“‘Os tempos’ são outros...” lança uma senil-senhora ao observar a sociedade pós-Woodstock, ainda que censurada pelo Ministério Público, através de seu aparelho de raios catódicos, em cenas que, em priscas eras pueiris e pudicas, nem imaginava observá-las com tamanho voyeurismo. Talvez seja assim que me sinta ao observar e comparar o X (10º) ao XI (11º) Salão de Artes Visuais da Cidade do Natal. Não por ignorância-anacrônica, mas pela proposta tão instantaneamente posta: um salão de arte contemporânea provocador à produção local de arte. Postura, esta, afim do enorme crescimento que Natal experimenta com seu surto de crescimento urbano com a negação de seus valores e assimilação de valores europeizados, que tem reflexos diretos sobre toda a produção da cidade. Crítica, esta, realizada nos trabalhos de Enio Cavalcante (perfomance, Veias), Edison Braatz (pintura com assemblage, Caranguejo dá em Árvore?), Célia Albuquerque (objeto, Herança II-Caleidoscópio), Alvaro Pereira (colagem, Urbanicidade) e Alberto Giuliani (pintura, Ribeira) que analisam o provinciano conceito progressivista fast-food e parafraseiam Chico Science “da lama ao caos/ do caos à lama/ o homem roubado nunca se engana” e “rios, pontes e overdrives impressionantes esculturas de lama” (para Alvaro, de papelão), espaço roubado e vendido ao capital exterior, VENDA-SE e FAÇA-SE (como meretrizes à espera de seu cliente), sem questões, sem porquês...
É... Os tempos são outros... Até se “congela” o tempo. Superpondo passado, presente e futuro. Ricardo Régis (fotografia digital, À Espera do Tempo), Max Pereira (fotografia digital, Dípticos 1, 2 e 3) e Rodrigo Sena (fotografia digital, Roda Viva), fotografias que apresentam o tempo este eterno passageiro que escorre pelos dedos, sem controle e, por muitas vezes, não percebido em suas nuances. A procura pelo “primitivismo” quase rupestre sintético de Flávio Freitas (pintura, Arquitetura) onde experimenta um reinício, onde pincel e tinta são instrumentos para o desenho, ao exemplo dos kanji, katakana e hiragana (ideogramas e escrita japonesa, à nanquim), coloridos com guache quase fluorescente (cores ligadas a psicodelia “pós-woodstoquiana”, fruto da ingestão de LSD, dietilamida do ácido lisérgico), unindo assim passado e a prospecção que se tinha sobre o século XXI (21), onde as pessoas se vestiriam com roupas prateadas e fluorescentes, contradizendo assim tamanhas as expectativas e afirmando que estamos cada vez mais próximos do passado. Mas, em contrapartida, o grupo Itaitinga Badarô (vídeo, Aracê), coletivo que segue a linha das novas tecnologias e visualidades partindo da experiência de um desenhista (Vinícius Dantas), uma radialista (Rita Machado) e um performer (Diego Andrade), lendo e discutindo a contemporaneidade partindo de um cotidiano-prisão para o sono-sonho de devaneios-libertos.
É tempo... Tempo para a reflexão sobre o que é a arte potiguar e a pertinência do Salão, bem como os critérios. Concordo com Cauê Alves quando ele se refere que o maior problema para a arte seja a ausência de incentivos públicos à produção artística, mas não concordo quando ele cita a cidade como privilegiada com relação ao fomento das Artes Visuais (bem como ações educativas e de palestras), falta na cidade o fomento a exposições (residências artísticas e auxílio montagem), a preservação e o incentivo aos artistas já consolidados no mercado artístico e o fomento aos novos artistas, até o Salão Jovem de Artes Visuais não existe mais. Enquanto mudanças não chegam, acredito em um Salão maior onde a produção contemporânea dialogue com a produção de artistas já consolidados e técnicos, não escolhendo apenas trinta. Traçando, em conjunto, ações de arte-educação com o propósito de tornar o espectador de arte da cidade um fruidor de arte, bem como a formação de público, construindo uma ponte entre o artista e a sociedade. A senil-senhora agradeceria...
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